terça-feira, julho 04, 2006
Uma manhã fria. Um céu cinzento. Céu que parecia refletir a cidade a seus pés, com seus cumes quadrados. Cidade que parecia refletir o céu a tocar-lhe os dedos finos e compridos, a abarcar antenas e ondas, conversas em celulares, programas de tevê, e narradores esforçados. Pessoas nas ruas que não sorriam. Andares preocupados que cobriam as calçadas. Olhares vidrados que seguiam, em meio à frieza matutina, apenas os outros olhares, a vigiá-las.
Entre passos apressados e murmúrios de quem não dorme o suficiente, escuta-se a sinfonia urbana, com carros, clarinetes, construções e Chico Buarque ao fundo. Típica mistura de manhã de quarta-feira numa cidade medrosa de que o dia acabe.
Nos rostos, sorrindo, franzinos, cansados, falando animadamente o mais novo trabalho, estava estampada a mesma preocupação daqueles que sobrevivem. Sinais, confusão no trânsito, um turbilhão de pessoas e uma agitação derradeira de meio de semana.
Entrando em um centro qualquer, uma porta de prédio se abre e revela um piso brilhante, quase molhado. As plantas também estavam cinza, e o sofá, marrom. A fumaça e o cheiro de cigarro que irritavam o porteiro ficam dançando os segundos que passam. Um elevador estéril, com espelho no teto, daqueles que não têm música, duas pessoas, três, quatro, cinco, doze andares. Três portas à esquerda e se chega naquilo que se chama casa. Uma casa suspensa nos ares. A porta é simpática, clarinha, entalhada, de fechadura dourada e simples. Não. Não existia tapete de boas vindas.